Alexandre Magno: Dave, eu estou sinceramente impressionado em quão rápido as pessoas começam a perceber os benefícios na prática do Estuarine Mapping – pelo menos essa tem sido minha experiência aqui no Brasil e também o que tenho ouvido de outros colegas. Você poderia nos dar uma rápida explicação sobre o Estuarine Mapping e a razão de você o ter criado?
Dave Snowden: Primeiro de tudo, estuário é uma metáfora muito poderosa. Eu a produzi em parte porque fiquei realmente irritado com as pessoas falando sobre orientação, fluxo e todo esse tipo de coisa. E, nessa linha, muitos continuam assumindo que tudo segue em apenas uma direção; e meu ponto é… bem, às vezes o que acontece é um movimento para trás. Foi quando surgiu a ideia do estuário. Eu lembro de dizer em uma chamada, “olha, mas essa situação que você está trazendo é mais um estuário do que um rio”. O que, seguindo com a metáfora, significa que a água pode ir em ambas as direções. Há salubridade, há fronteira entre água salgada e água doce, os bancos de areia que você tem que verificar frequentemente, há penhascos de granito que você também tem que observar, você pode fazer coisas na virada da maré, enfim. É uma metáfora realmente poderosa para uma situação complexa do mundo real, e foi daí que parti.
Mas veja, a metáfora veio depois da ideia inicial de olhar para a teoria de construtores na física, que eu tenho acompanhado por seis a oito anos agora. E, a propósito, é assim que desenvolvemos métodos, sabe, muitos anos explorando o lado teórico para então começar a mover para a prática. Essa teoria basicamente diz que, antes de qualquer coisa, você tem que descobrir o que não pode mudar, então você tem que descobrir o que está presente e que você pode mudar, e então o que se mostrar com o menor gradiente de energia é o que vai prevalecer. Isso fez um enorme sentido. Dessa forma, conforme eu brincava com isso por muito tempo, culminamos com este conceito de custo de energia contra tempo, a zona contrafactual, a zona vulnerável, a zona liminar.
De fato, isso parece apenas explicitar para as pessoas que antes de qualquer coisa, antes de decidir o que fazer, temos que mapear nosso território. Isso significa que o Estuarine Mapping é na verdade um pré-processo, o que conecta também com um conceito chave de complexidade relacionado a granularidade das coisas. Então, boa parte do trabalho é quebrar e quebrar o material que estamos mapeando até posiciona-lo finamente granulado, e então permitir que ele se recombine. E é assim que a complexidade funciona. Ela escala por decomposição, recombinação, não por agregação.
O Estuarine Mapping tem possibilidades realmente poderosas que vão além da estratégia de negócios, como por exemplo, arquitetura de software. Essa é a próxima etapa em que estou trabalhando no momento. No sentido de que o Estuarine Mapping realmente indique onde você pode construir restrições ou construtores na arquitetura do software, a fim de mudar os gradientes de energia no trabalho das pessoas. Então, você reduz radicalmente o custo do desenvolvimento de software através da mudança das interações e não apenas produzindo código mais rápido.
Algo super importante a qual falo com frequência, e o Estuarine Mapping passa por esse teste – é chamado de “teste do verso do guardanapo de mesa”, para o qual existe um maravilhoso substantivo alemão, que eu tenho que começar a usar em vez disso. Ele diz que, se você não consegue desenhar de memória uma ideia ou processo no verso de um guardanapo, ninguém vai usá-lo na prática.
Alexandre Magno: Nessa linha, você enxerga também que o Estuarine Mapping é valioso tanto para pequenas empresas e startups como para grandes organizações? Há um contexto ideal para aplicação do método?
Dave Snowden: Sim, ele é valioso em ambos os casos. E, a propósito, nós estamos usando isso agora até mesmo para indivíduos, ou seja, o Estuarine Mapping é genuinamente fractal. Se quiser, você pode utiliza-lo de forma bem rápida, em poucas horas, e para possibilitar isso ainda mais, nós da The Cynefin Co. estamos nesse momento trabalhando em kits para ajudar as pessoas a facilitarem a dinâmica. O princípio de todo esse trabalho é de que você não deveria se mover até que tenha pelo menos mapeado o que é possível, o que, na prática, me parece um conceito bastante básico, não? Mas isso realmente incomoda muita gente. Por exemplo, recentemente, isso realmente incomodou um system thinker quando eu estava fazendo um seminário militar, porque a pessoa que palestrava antes de mim disse: “você define seus objetivos e então fecha a lacuna.” E eu disse, “Bem, você não pode fazer isso se for complexo, porque tudo o que você vai conseguir com isso é produzir incentivos perversos e desencadear consequências não intencionais. Você tem que começar de onde você está, e meio que descobrir para onde você pode ir em seguida, e então continuar olhando.”E foi interessante perceber que a pessoa simplesmente não conseguia entender esse conceito de que você deve começar com a realidade – para ela tudo era sobre começar com um estado fictício e tentar fazer a ficção acontecer em vez de começar com a realidade e permanecer nela.
Alexandre Magno: E como o Estuarine Mapping se integra com todo o ecossistema da The Cynefin Co.?
Dave Snowden: O Cynefin é um framework de suporte à decisão, que usa a complexidade, mas não é uma estrutura de complexidade. Já o Estuarine Mapping é complexidade pura – é sobre mapear o ecossistema. Então, à medida que você faz o Estuarine Mapping e gera um conjunto de ações você as move e as agrupa no Cynefin seguindo o seu processo. Já Flexuous Curves pode aparecer com um tipo particular de ação no Estuarine Mapping. Mas cada um deles é autônomo, e cada um pode ser usado a partir do outro. Se você está fazendo uma estratégia, por exemplo, você pode começar com Flexuous Curves, depois fazer Estuarine Mapping e então fazer Cynefin.
Já o SenseMaker pode ser usado para gerar um Estuarine Mapping, o que vai estar mudando ao longo do próximo ano para a produção contínua desses mapas. E isso significa a implantação operacional do SenseMaker – o que chamamos de SenseMaker GEMBA. A segunda coisa é todo um conceito de redes de sensores humanos, (..) Construir redes de sensores humanos, para que, à medida que você inicia as ações no Estuarine Mapping, você possa ver se elas estão tendo um impacto e se estão mudando as coisas.
Então, há uma série de desenvolvimentos sobre os quais provavelmente estaremos falando daqui a um ano, que de alguma forma move tanto o SenseMaker quanto o Estuarine Mapping para um plano diferente em termos de prática, combinando efetivamente estratégia e tática em uma única estrutura, em um único ponto no tempo. Com isso, você quebra a linearidade entre estratégia e tática. Esse é o grande objetivo, e nós sabemos como fazer isso.